
Você se aventura a dar umas braçadas em mar, rio, lago, represa etc. O que você faz, afinal, é natação, maratona aquática, águas abertas, travessia ou só maluquice?
Em um breve histórico da natação, o COI (Comitê Olímpico Internacional) nos conta que o ato de nadar remonta aos tempos pré-históricos. Há registros da prática em pinturas rupestres de 7.000 anos atrás e referências a ela por escrito há mais de 4.000 anos. Somente no século 19 a natação se tornou amplamente praticada como esporte competitivo. As primeiras competições foram realizadas pela National Swimming Society of Great Britain (Sociedade Nacional de Natação da Grã-Bretanha), criada em 1837.

A World Aquatics, antiga Fina, órgão mundial que rege algumas modalidades aquáticas, tem várias normas com especificações detalhadas das piscinas para que tempos obtidos com esse ato pré-histórico possam ser oficializados.
A entidade define natação em águas abertas como qualquer competição que ocorre em rios, lagos, oceanos ou canais de água. A CBDA (Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos) logicamente segue essa determinação, e nas regras traduzidas está claro: “MARATONA AQUÁTICA pode ser definida como qualquer prova de águas abertas na distância de 10 Km (sic)”.

Mauricio de Oliveira, coordenador de águas abertas indoor da CBDA e responsável pela tradução das regras, diz que a maratona aquática corresponde aos 42,195 km no atletismo.
No programa olímpico de Paris 2024 a maratona aquática acontece nos dias 8 (prova, logicamente de 10 km, feminina) e 9 de agosto (masculina).
Vencedora nas águas abertas, na piscina e na maratona
Ana Carolina Tange Morelli foi vice-campeã na categoria 30 + na prova de águas abertas do Mundial master de Doha, em fevereiro. A competição reúne atletas com mais de 25 anos e acontece nas mesmas instalações do Mundial, disputado semanas antes pela elite internacional dos esportes aquáticos.
Ela completou os 3.000 metros em 39min17s3, atrás da austríaca Alexandra Raus, que venceu com 39min12s7. O final da prova foi eletrizante, e Ana Carolina chegou 8 décimos à frente da britânica Hannah Elizabeth Dodwell.

Dias depois da conquista no Porto Antigo de Doha, a nadadora voltou cair na água, desta vez no Aspire Dome, para as provas de piscina. A extensa programação com oito provas incluía provas de meio fundo e fundo (400 m e 800 m livre), mas também de velocidade (50 m costas e revezamentos 4×50 m livre e medley). O melhor resultado veio em 31s68, com o título nos 50 m costas. “A prova de velocidade que eu amo nadar“, escreveu ela no Instagram.
Ana Carolina fez tudo isso depois de, em dezembro de 2023, ser campeã de uma maratona aquática na represa Billings, em São Bernardo do Campo (SP). A atleta de Campinas venceu os 10 km da SPSwim em 2h31min33s.
Lastro de treino permite versatilidade
O ultramaratonista e técnico da atleta, Samir Barel, explicou que é muito difícil conciliar os treinos de velocidade, com os de meio fundo e fundo e mais ainda com os de maratona.
“Há muitos anos, a Carol treinou velocidade, e isso permite que ela mantenha um certo nível mesmo treinando para provas longas”, afirmou. “Isso com o tempo vai acabando, mas por enquanto ela ainda tem esse lastro, e a gente conseguiu encaixar velocidade com as longas.”

Samir, que também fez dobradinha nas águas abertas e na piscina no Mundial master de Doha (foi prata nos 3.000 m e nos 800 m livre), disse que para profissionais é praticamente impossível conciliar tudo. “Mas para o atleta amador muitas vezes a gente consegue”, afirmou.
“Ela (Carol) acaba não tendo o melhor resultado da vida na velocidade, mas por ter uma boa base aeróbica constituída pelos treinos de longa distância ela consegue fazer a manutenção da velocidade. O foco é nas longas distâncias, mas a gente coloca alguns estímulos de velocidade para poder render também nas provas mais curtas.”
Mas e a travessia?
Outro termo utilizado em diversas provas pelo Brasil é “travessia”. Segundo os dicionários, travessia é o ato de atravessar, ou seja, ir de um lado a outro. Algumas provas que usam essa denominação, no entanto, largam e chegam no mesmo lugar, o que faz parecer impróprio o emprego do termo “travessia” nesses casos.
A professora Thais Nicoleti, autora dos livros Redação Linha a Linha (Publifolha, 2004) e Uso da Vírgula (Manole, 2004) e responsável pelo blog com seu nome na Folha de S.Paulo, explica que o significado das palavras pode sofrer alterações, seja para ampliar conceitos, seja para adaptá-los a contextos específicos.
“É possível que, nesta situação particular, a ideia de atravessar esteja menos ligada aos pontos de partida e de chegada, como ocorre no caso de atravessar uma rua, e mais à noção de percorrer, ir ao longo de ou mesmo de abrir caminho, já que, na natação, a ‘travessia’ é um tipo de prova em águas abertas. Aparentemente, o termo marca a oposição entre águas abertas e uma piscina”, diz.
No mundo da corrida de rua, que guarda semelhanças com o das águas abertas e é frequentado por alguns nadadores, existem sujeitos afetados que acreditam que só quem corre a partir de determinada distância pode ser considerado corredor.
A fisioterapeuta e corredora Raquel Castanharo conta que essa pressão pode prejudicar os praticantes e provocar lesões. Dentro da água é a mesma coisa.
Excelente texto. Leve e instrutivo.
Valeu.